I
A
presente era Contemporânea (que alguns teóricos como Pablo Gentili, Boaventura
de Souza santos e, mesmo Anthony Guiddens, preferem chamar de Pós-moderna), erigida,
assim como a Moderna, a partir do “penso, logo existo” Cartesiano com seus
ranços positivistas, sistematizando-se a sobreposição da razão sobre e/ou em
detrimento da emoção e/ou, na mesma via, a sobreposição do espírito sobre e/ou em
detrimento da alma, instituíram tragicamente os processos de racionalização das
emoções, culminando-se no desenvolvimento da “arte racional da dissimulação”
(dita inteligência emocional), sistematizando-a como uma espécie de valor
social. Em outras palavras, as sociedades capitalistas ocidentais Modernas (e
Contemporâneas), inauguradas por Descartes com o seu chamado “espírito
cartesiano”, sintetizada e sistematizada na sua conhecida máxima “penso, logo
existo”, tiraram dos homens as suas almas, as suas matérias e elegeram,
instituíram, sacramentaram e/ou cristalizaram a razão, somente a razão, como a
essência do ser humano.
II
Ora,
mas o que seria um homem dotado somente de espírito (razão) e não também de
alma (singularidade, subjetividade, sentimentos), sendo que, na alma de um ser
está, entre muitas outras coisas, a sua realidade sensível, a sua expressão
natural, a sua essência, a sua espontaneidade, o seu modo autêntico de ser
diante dos outros seres durante a sua inserção na vida social?
III
Como
se verá de forma mais aprofundada ao longo deste trabalho, um homem
“desalmado”, dotado somente de espírito, somente de razão, é aquele que, entre muitas
outras coisas:
1- É capaz
de Amar sem amor;
2- É
capaz de Fazer sexo sem vontade, sem amor e, até mesmo sozinho;
3- É
capaz De Viver somente para trabalhar e não trabalhar para viver;
4- É
capaz De Trabalhar somente pelo dinheiro;
5- É
capaz De Se alimentar sem sentir e/ou estar com fome;
6- É
capaz De Confundir necessidade com vontade;
7- É
capaz De Não falar o que é verdadeiro, mas somente o que faz sentido e/ou o que
é lógico, visando sempre algum benefício;
8- É
capaz De Colocar a produtividade no lugar da atividade prazerosa;
9- É
capaz De Usar suas emoções, a serviço da razão, para dissimular, ludibriar e
alcançar seus objetivos;
10-
É capaz de Ser conscientemente um desalmado
e ver nisso um valor social.
Em
outras palavras, citando Hannah Arendt:
“O que é verdadeiro para o
espírito nem sempre é verdadeiro para a alma” e, nesse sentido, o Cartesianismo
fez a sua escolha: preferiu ficar só com o espírito e abriu mão da sua alma.
(1971 – A vida do espírito)
IV
Esta
obra, nesse sentido, procurará aprofundar questionamentos sobre a condição humana e, ao mesmo tempo,
apontar caminhos (do ponto de vista da retomada dos processos de humanização e de
retomada da autonomia intelectual), buscando respaldo nas fundamentações epistemológicas
de Hannah Arendt, Kant, Aristóteles, Nietzsche e muitos outros.